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Todas as Cadeias
em um de os últimos anos de a [sua [2]] vida longa e laboriosa , [Jaspers [2]] foi visitado por [um admirador [380]] [que [380]] mostrou curiosidade em saber [as leituras [5]] [que [5]] [ele [2]] estava ultimamente fazendo , a ao_que [o filósofo germânico [2]] contestou dizendo que só lia [jornais e revistas... [5]] por não ter [tempo [11]] para ler [livros [11]] . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de [Jaspers [2]] que tudo o que foi desde há muito condensado em [livros [11]] , colecções e [bibliotecas [19]] , versando o que é e quem é [o ser humano [19]] e , por extensão , [a humanidade [355]] . [O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo [356]] é certamente [a revelada incapacidade de [a cultura ocidental [78]] para compreender [o homem [19]] e prever o [seu [19]] comportamento [356]] . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta [distância [28]] de [nós [34]] , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , [ninguém [39]] , há um século , parecia poder prever [o curso desastroso [381]] [que [381]] [a civilização ocidental [78]] viria a trilhar , arrastando com [si [78]] [o destino de [toda a humanidade [355]] [39]] e ameaçando com a própria extinção de [a vida [34]] em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , [certos pensadores [359]] espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : [Ingenieros , [359]] [Jaspers [359]] [2]] , Gasset , por um lado , [Aldous_Huxley [359]] e [Orwell [359]] , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de [sociedades inteiras [382]] [que [382]] cabiam em o quadro de [a patologia colectiva ou social [62]] . E , em curtos anos , todas essas constatações e [previsões [77]] [se [78]] viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a [um fatalismo [383]] [que [383]] parecia escapar a a vontade de [os homens [19]] e dirigi [-los [88]] para monstruosos padrões de [existência [34]] . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao [o carácter patológico de [a sociedade ocidental [360]] [78]] . E mais , perguntamo [-nos [94]] hoje se [esse processo doentio [360]] não deve estender -se a [a natureza [97]] de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a [o gigantismo [384]] [que [384]] lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a [o progresso técnico [374]] . [Koestler [88]] , em 1969 , levanta a hipótese de [[a sociedade humana [357]] [357]] , desde a sua origem , ser [[uma realidade [385]] [cujas manifestações [385]] típicas são inequivocamente patológicas [357]] ( a a luz de as regras de [a vida [34]] ) , enquanto [o sociólogo negro Diawara [94]] coloca em [a sociedade pós - neolítica [358]] o começo de [esse processo doentio [360]] . [O homem social [97]] terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a [sociedade civilizada [358]] ) [um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital [97]] , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a [sua [97]] condenação inapelável como forma de [vida [34]] ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que [o homem [19]] não devia obedecer a [a natureza [77]] , mas sim vencê [-la [77]] , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava [o erro cometido por [a espécie humana [386]] [19]] , [que [386]] conduzira a [uma existência social [387]] [que [387]] apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que [a humanidade [355]] vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado [a humanidade [355]] a procurar vencer [a Natureza [77]] obedecendo [-lhe [77]] . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , [a posição contrária [388]] , [a [388]] de que [o destino de [a humanidade [355]] [39]] consistia em desafiar e vencer [a Natureza [77]] contrariando-a . Esta forma de [o homem [19]] mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem [própria [19]] , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou [o frenesim psíquico [389]] [que [389]] se apossou de [a civilização ocidental [78]] , [convertendo-a [78]] em [uma espécie de [atleta [390]] [que [390]] procura exceder -se cada vez mais em a execução de as [suas [390]] cabriolas [78]] , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até [a a 2ª_Guerra_Mundial [394]] ou , mais_concretamente , até [1945 [367]] . em [esse momento [367]] , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de [as teorias de [o homem [19]] e de a sociedade [391]] [que [391]] apelavam para um confronto com [a Natureza [77]] em a busca de um destino original e descontínuo com [as outras formas de [vida [34]] [363]] ; [um sentimento colectivo de [receio [158]] e de horror , [361]] [uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência [361]] , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas [as vias [392]] [que [392]] [a cultura [362]] empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado [discussões [393]] [que [393]] já haviam tido os [seus [393]] começos em os anos anteriores a [o conflito mundial [394]] . [Os biólogos [222]] puseram claramente os perigos decorrentes de [os vícios genéticos [395]] de [que [395]] sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em [a selecção biológica [233]] e de as negativas consequências de o meio económico-social em [o aperfeiçoamento [237]] de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em [outros tipos de vida colectiva [363]] , [peixes , aves e mamíferos [363]] . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em [o homem social [97]] e em [a vida [34]] em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em [outras espécies vivas [363]] , fez -nos mergulhar em [um romance fascinante [396]] em [que [396]] [a Natureza [77]] mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que [muitas de [as manifestações psicosociais [397]] [que [397]] se consideravam exclusivas de o [homem [19]] e frutos de a [sua [19]] emancipação frente a [as outras formas de [vida [34]] [363]] [365]] , eram ainda [formas sofisticadas de [comportamento [280]] nascidas de instintos e tendências remanescentes de [sua [19]] existência animal [365]] . Por_fim , veio um importante artigo sobre [os antropóides [222]] e etnólogos . [Os estudos mais antigos sobre [os antropóides [222]] e as sociedades primatas [399]] , [que [399]] tiveram [precursores de mérito [400]] em [Kohler [400]] , [Zukermann [400]] , [Yerkes [400]] , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , [Miss_Patterson [233]] , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre [a psicologia individual e colectiva [237]] de [os nossos mais próximos parentes em a escala animal [222]] . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre [os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos [222]] e [os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial [19]] . Que [distância [28]] separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que [fluido subtil [331]] distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de [Koko [366]] , [a gorila a [quem [366]] [M. Patterson [233]] conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos [366]] ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que [o homem civilizado [368]] , [habitante de uma sociedade antinatural [368]] , é [um animal doméstico [368]] [que [368]] perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de [natureza ética [354]] . [Contudo [355]] , ainda é em [[o estudo [356]] de [as sociedades primitivas [369]] [280]] e em a interpretação de as [suas [369]] regras , de [a psicologia individual e colectiva [237]] , em [a sua comparação [361]] com [as sociedades históricas e actuais [362]] , [que [363]] podemos encontrar mais matéria reflexiva . [Os animais inferiores , os primatas e [o homem primitivo [370]] [371]] constituem [uma linha evolutiva que [se [368]] revela sempre mais complexa [371]] , até desembocar em [o salto qualitativo [372]] [que [372]] é [a civilização [372]] . E aí parece que [um acontecimento inexplicável [373]] , [uma benção ou [maldição [374]] [373]] , mas certamente [uma adulteração de [as regras naturais [373]] [376]] , empurrou [o homem [19]] para [uma via original [378]] , com [desconhecidos propósitos [401]] a [que [401]] [a tecnologia moderna [374]] começou a dar contornos aterradores . Será já [o homem primitivo [370]] [um ser antinatural [370]] , ou seja , em uma visão puramente naturalista , [um doente [370]] ? Teria sido com [o missing [link [386]] [402]] [que [402]] [se [388]] iniciou [a marcha irreversível para [a patologia social e individual [390]] [389]] ? [O sociólogo Diawara [94]] argumenta que a longevidade e [estabilidade [394]] de [[as sociedades primitivas [395]] [369]] justifica a [sua [369]] sanidade , embora não recuse a [sua [369]] originalidade frente a [a restante vida natural [363]] , antes por [o contrário [400]] . [O homem primitivo [370]] seria então [o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem [402]] entendido como [elemento [criador [404]] de [uma sociedade futura [405]] [403]] sui generis e verdadeiramente humanas . Entre [[os seres humanos primitivos [370]] , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , [403]] [que [403]] mostram [as revistas [409]] e os jornais , [e [os seres humanos [411]] civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo [368]] , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de [cultura [362]] [[o homem [19]] [19]] revelou [[aquela alma espiritual [404]] [331]] [que [404]] [331]] hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . [O estudo de [as sociedades primitivas [280]] ( [369]] de [as quais [369]] não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem [os outros pecados mortais de [a espécie [405]] [19]] , [que [405]] [Koestler [88]] assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em [elas [369]] não tinham lugar os psiquiatras , mas em [todas [369]] se encontra [o feiticeiro [376]] [( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) [376]] e , pior que [isso [376]] , [o soma pacificante [406]] de [que [406]] [Aldous_Huxley [378]] falara em [o [seu [378]] Admirável_Mundo_Novo [377]] . [Este mal de o século , [354]] como [lhe [354]] chamou Hans_Selve , [o stress [354]] , é [doença [62]] que já existia em [as sociedades primitivas [369]] , que existe hoje e que [Huxley [378]] previa existir em [o [seu [378]] mundo mecanizado e artificial [377]] [354]] , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas [esse stress [354]] [que [354]] é afinal [o resultado de uma incapacidade de adaptação de [o homem [19]] a o meio-ambiente civilizacional [354]] não significará a [sua [19]] condenação como ser vivo ? O [seu [354]] carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que [a natureza [77]] decidiu que [ele [19]] começa a não ter condições de continuar a viver , tal como [um carro [407]] [que [407]] começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? [As tentativas de resposta modernas em a luta contra [o stress [379]] [354]] : [a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , [379]] imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por [a tecnologia química [408]] , com [os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta [408]] . A vitória sobre [o stress [354]] , [o receio [158]] , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a [o controlo farmacológico [408]] levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual [a diferença [409]] [que [409]] possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje [aquela afirmação , [410]] aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja [a [410]] de que [o grande homem [411]] é [aquele [411]] [que [411]] tem mais consciência de a [sua [411]] condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e [bibliotecas [19]] , versando o que é e quem é [o ser humano [19]] e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender [o homem [19]] e prever o [seu [19]] comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de [os homens [19]] e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que [o homem [19]] não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por [a espécie humana [19]] , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de [o homem [19]] mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem [própria [19]] , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de [o homem [19]] e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o [homem [19]] e frutos de a [sua [19]] emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de [sua [19]] existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e [os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial [19]] . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou [o homem [19]] para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura [[o homem [19]] [19]] revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de [a espécie [19]] , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de [o homem [19]] a o meio-ambiente civilizacional não significará a [sua [19]] condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que [ele [19]] começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de [natureza ética [354]] . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . [Este mal de o século , [354]] como [lhe [354]] chamou Hans_Selve , [o stress [354]] , é [doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial [354]] , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas [esse stress [354]] [que [354]] é afinal [o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional [354]] não significará a sua condenação como ser vivo ? O [seu [354]] carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra [o stress [354]] : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre [o stress [354]] , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de [as sociedades primitivas [369]] e em a interpretação de as [suas [369]] regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de [as sociedades primitivas [369]] justifica a [sua [369]] sanidade , embora não recuse a [sua [369]] originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de [as sociedades primitivas ( [369]] de [as quais [369]] não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em [elas [369]] não tinham lugar os psiquiatras , mas em [todas [369]] se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em [as sociedades primitivas [369]] , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e [previsões [77]] se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a [a natureza [77]] , mas sim vencê [-la [77]] , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer [a Natureza [77]] obedecendo [-lhe [77]] . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer [a Natureza [77]] contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com [a Natureza [77]] em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que [a Natureza [77]] mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que [a natureza [77]] decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de [nós [34]] , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de [a vida [34]] em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de [existência [34]] . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de [a vida [34]] ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de [vida [34]] ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de [vida [34]] ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em [a vida [34]] em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de [vida [34]] , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de [a cultura ocidental [78]] para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que [a civilização ocidental [78]] viria a trilhar , arrastando com [si [78]] o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões [se [78]] viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de [a sociedade ocidental [78]] . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de [a civilização ocidental [78]] , [convertendo-a [78]] em [uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas [78]] , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com [as outras formas de vida [363]] ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em [outros tipos de vida colectiva [363]] , [peixes , aves e mamíferos [363]] . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em [outras espécies vivas [363]] , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a [as outras formas de vida [363]] , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , [que [363]] podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a [a restante vida natural [363]] , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a [sua [2]] vida longa e laboriosa , [Jaspers [2]] foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que [ele [2]] estava ultimamente fazendo , a ao_que [o filósofo germânico [2]] contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de [Jaspers [2]] que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , [Jaspers [2]] , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , [a humanidade [355]] . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de [toda a humanidade [355]] e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que [a humanidade [355]] vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado [a humanidade [355]] a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de [a humanidade [355]] consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . [Contudo [355]] , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que [o homem civilizado [368]] , [habitante de uma sociedade antinatural [368]] , é [um animal doméstico [368]] [que [368]] perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que [se [368]] revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , [e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo [368]] , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e [o homem primitivo [370]] constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já [o homem primitivo [370]] [um ser antinatural [370]] , ou seja , em uma visão puramente naturalista , [um doente [370]] ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . [O homem primitivo [370]] seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre [os seres humanos primitivos [370]] , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a [a natureza [97]] de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . [O homem social [97]] terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) [um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital [97]] , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a [sua [97]] condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em [o homem social [97]] e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . [Os biólogos [222]] puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre [os antropóides [222]] e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre [os antropóides [222]] e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de [os nossos mais próximos parentes em a escala animal [222]] . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre [os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos [222]] e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , [certos pensadores [359]] espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : [Ingenieros , [359]] [Jaspers [359]] , Gasset , por um lado , [Aldous_Huxley [359]] e [Orwell [359]] , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para [uma via original [378]] , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que [Aldous_Huxley [378]] falara em o [seu [378]] Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que [Huxley [378]] previa existir em o [seu [378]] mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram [precursores de mérito [400]] em [Kohler [400]] , [Zukermann [400]] , [Yerkes [400]] , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por [o contrário [400]] . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e [os seres humanos [411]] civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que [o grande homem [411]] é [aquele [411]] [que [411]] tem mais consciência de a [sua [411]] condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de [as regras naturais [376]] , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra [o feiticeiro [376]] [( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) [376]] e , pior que [isso [376]] , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de [atleta [390]] [que [390]] procura exceder -se cada vez mais em a execução de as [suas [390]] cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para [a patologia social e individual [390]] ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber [as leituras [5]] [que [5]] ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia [jornais e revistas... [5]] por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter [tempo [11]] para ler [livros [11]] . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em [livros [11]] , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , [ninguém [39]] , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si [o destino de toda a humanidade [39]] e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que [o destino de a humanidade [39]] consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi [-los [88]] para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . [Koestler [88]] , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que [Koestler [88]] assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo [-nos [94]] hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto [o sociólogo negro Diawara [94]] coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? [O sociólogo Diawara [94]] argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em [a selecção biológica [233]] e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , [Miss_Patterson [233]] , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem [M. Patterson [233]] conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em [o aperfeiçoamento [237]] de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre [a psicologia individual e colectiva [237]] de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de [a psicologia individual e colectiva [237]] , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de [comportamento [280]] nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em [o estudo de as sociedades primitivas [280]] e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . [O estudo de as sociedades primitivas [280]] ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que [fluido subtil [331]] distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou [aquela alma espiritual [331]] [que [331]] hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . [O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo [356]] é certamente [a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento [356]] . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em [o estudo [356]] de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de [[a sociedade humana [357]] [357]] , desde a sua origem , ser [uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas [357]] ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao [o carácter patológico de a sociedade ocidental [360]] . E mais , perguntamo -nos hoje se [esse processo doentio [360]] não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de [esse processo doentio [360]] . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; [um sentimento colectivo de receio e de horror , [361]] [uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência [361]] , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em [a sua comparação [361]] com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que [a cultura [362]] empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com [as sociedades históricas e actuais [362]] , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de [cultura [362]] o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de [Koko [366]] , [a gorila a [quem [366]] M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos [366]] ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em [o salto qualitativo [372]] [que [372]] é [a civilização [372]] . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que [um acontecimento inexplicável [373]] , [uma benção ou maldição [373]] , mas certamente [uma adulteração de as regras naturais [373]] , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a [o progresso técnico [374]] . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou [maldição [374]] , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que [a tecnologia moderna [374]] começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava [o erro cometido por a espécie humana [386]] , [que [386]] conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing [link [386]] que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , [a posição contrária [388]] , [a [388]] de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que [se [388]] iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou [o frenesim psíquico [389]] [que [389]] se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou [a marcha irreversível para a patologia social e individual [389]] ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado [discussões [393]] [que [393]] já haviam tido os [seus [393]] começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até [a a 2ª_Guerra_Mundial [394]] ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a [o conflito mundial [394]] . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e [estabilidade [394]] de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de [os vícios genéticos [395]] de [que [395]] sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de [as sociedades primitivas [395]] justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com [o missing link [402]] [que [402]] se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então [o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem [402]] entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como [elemento criador de uma sociedade futura [403]] sui generis e verdadeiramente humanas . Entre [os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , [403]] [que [403]] mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento [criador [404]] de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou [aquela alma espiritual [404]] [que [404]] hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de [uma sociedade futura [405]] sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem [os outros pecados mortais de a espécie [405]] , [que [405]] Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por [a tecnologia química [408]] , com [os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta [408]] . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a [o controlo farmacológico [408]] levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram [as revistas [409]] e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual [a diferença [409]] [que [409]] possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta [distância [28]] de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que [distância [28]] separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de [a patologia colectiva ou social [62]] . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é [doença [62]] que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de [receio [158]] e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , [o receio [158]] , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em [a sociedade pós - neolítica [358]] o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a [sociedade civilizada [358]] ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que [muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida [365]] , eram ainda [formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal [365]] . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até [1945 [367]] . em [esse momento [367]] , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . [Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo [371]] constituem [uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa [371]] , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em [o seu Admirável_Mundo_Novo [377]] . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em [o seu mundo mecanizado e artificial [377]] , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? [As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress [379]] : [a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , [379]] imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por [um admirador [380]] [que [380]] mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever [o curso desastroso [381]] [que [381]] a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de [sociedades inteiras [382]] [que [382]] cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a [um fatalismo [383]] [que [383]] parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a [o gigantismo [384]] [que [384]] lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser [uma realidade [385]] [cujas manifestações [385]] típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a [uma existência social [387]] [que [387]] apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de [as teorias de o homem e de a sociedade [391]] [que [391]] apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas [as vias [392]] [que [392]] a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em [um romance fascinante [396]] em [que [396]] a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de [as manifestações psicosociais [397]] [que [397]] se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . [Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas [399]] , [que [399]] tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com [desconhecidos propósitos [401]] a [que [401]] a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , [o soma pacificante [406]] de [que [406]] Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como [um carro [407]] [que [407]] começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje aquela afirmação , aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja a de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...
em um de os últimos anos de a sua vida longa e laboriosa , Jaspers foi visitado por um admirador que mostrou curiosidade em saber as leituras que ele estava ultimamente fazendo , a ao_que o filósofo germânico contestou dizendo que só lia jornais e revistas... por não ter tempo para ler livros . Nada parece melhor corresponder a esta resposta de Jaspers que tudo o que foi desde há muito condensado em livros , colecções e bibliotecas , versando o que é e quem é o ser humano e , por extensão , a humanidade . O fenómeno cultural mais importante de o nosso tempo é certamente a revelada incapacidade de a cultura ocidental para compreender o homem e prever o seu comportamento . A não ser umas quantas vozes , assaz reduzidas , de pensadores proféticos e situados a curta distância de nós , um Burkhardt , um Nietzsche , por_exemplo , ninguém , há um século , parecia poder prever o curso desastroso que a civilização ocidental viria a trilhar , arrastando com si o destino de toda a humanidade e ameaçando com a própria extinção de a vida em o planeta . Ainda em a década de trinta , há uns escassos cinquenta anos , certos pensadores espantavam o público cultivado com referências sociológicas e sugestões para - historizantes denominadas pessimistas : Ingenieros , Jaspers , Gasset , por um lado , Aldous_Huxley e Orwell , por outro , chamavam a atenção para manifestações psico-sociológicas inéditas ou a eventualidade de a construção de sociedades inteiras que cabiam em o quadro de a patologia colectiva ou social . E , em curtos anos , todas essas constatações e previsões se viram ultrapassadas por os factos , tendo -se tornado patente que a vida social passara a estar sujeita a um fatalismo que parecia escapar a a vontade de os homens e dirigi -los para monstruosos padrões de existência . Deixaram de subsistir dúvidas quanto_ao o carácter patológico de a sociedade ocidental . E mais , perguntamo -nos hoje se esse processo doentio não deve estender -se a a natureza de o próprio fenómeno social , tornado perceptível devido a o gigantismo que lhe foi imprimido por a sobrepopulação associada a o progresso técnico . Koestler , em 1969 , levanta a hipótese de a sociedade humana , desde a sua origem , ser uma realidade cujas manifestações típicas são inequivocamente patológicas ( a a luz de as regras de a vida ) , enquanto o sociólogo negro Diawara coloca em a sociedade pós - neolítica o começo de esse processo doentio . O homem social terá sido desde sempre ( isto é , logo que a sociedade primitiva deu origem a a sociedade civilizada ) um ente enfermiço e condenado a a degenerescência vital , o_que , a_longo_prazo , poderia significar a sua condenação inapelável como forma de vida ? Esta pergunta , posta explícita ou implicitamente , levou a uma intensa , diríamos frenética , busca de explicações e justificações . Saía -se assim de a posição equívoca de que o homem não devia obedecer a a natureza , mas sim vencê -la , para outra muito mais humilde e conforme com as consequências : procurar ver onde se situava o erro cometido por a espécie humana , que conduzira a uma existência social que apontava directamente para o suicídio colectivo . A desconfortável sensação de que a humanidade vinha trilhando uma senda divergente de os desígnios naturais , fora apercebida por muitos pensadores , cabendo a Francisco_Bacon o mérito inestimável de ter dado o grito de alerta , a o ter aconselhado a humanidade a procurar vencer a Natureza obedecendo -lhe . em o entanto , por um fenómeno que só uma psicanálise histórica poderia explicar , tomou ascedência , durante séculos , a posição contrária , a de que o destino de a humanidade consistia em desafiar e vencer a Natureza contrariando-a . Esta forma de o homem mostrar que já não era animal e podia construir uma ordem própria , paralela ou até divergente de a ordem natural , alimentou o frenesim psíquico que se apossou de a civilização ocidental , convertendo-a em uma espécie de atleta que procura exceder -se cada vez mais em a execução de as suas cabriolas , seduzido por os incitamentos de o público . Tudo isto até a a 2ª_Guerra_Mundial ou , mais_concretamente , até 1945 . em esse momento , não só alguns longínquos visionários , nem_sequer um certo número de pensadores argutos ou de sociólogos advertidos , reconheceram a falência de as teorias de o homem e de a sociedade que apelavam para um confronto com a Natureza em a busca de um destino original e descontínuo com as outras formas de vida ; um sentimento colectivo de receio e de horror , uma espécie de inconsciente colectivo de sobrevivência , fez -se sentir , pedindo novas explicações e uma compreensão inédita de o problema humano . Foram diversas as vias que a cultura empreendeu , correspondendo -lhe best-sellers e tendo -se generalizado discussões que já haviam tido os seus começos em os anos anteriores a o conflito mundial . Os biólogos puseram claramente os perigos decorrentes de os vícios genéticos de que sofria a humanidade actual . Muller_Morgan e muitos outros falaram de a diminuição de a qualidade genética decorrente de o aumento populacional , de a acção de a medicina moderna em a selecção biológica e de as negativas consequências de o meio económico-social em o aperfeiçoamento de a biologia humana . Os etologistas , com Lorenz a a frente , debruçaram -se sobre alguns fenómenos socialmente ameaçadores , como a agressividade e o parasitismo , tendo-os estudado em outros tipos de vida colectiva , peixes , aves e mamíferos . Procurar a destrinça de o que é natural ou não , em o homem social e em a vida em sociedade , por comparação e analogia com o_que se passa em outras espécies vivas , fez -nos mergulhar em um romance fascinante em que a Natureza mostrou exceder a imaginação de todos os mestres de a literatura... Tiveram o mérito , estes trabalhos , de revelar que muitas de as manifestações psicosociais que se consideravam exclusivas de o homem e frutos de a sua emancipação frente a as outras formas de vida , eram ainda formas sofisticadas de comportamento nascidas de instintos e tendências remanescentes de sua existência animal . Por_fim , veio um importante artigo sobre os antropóides e etnólogos . Os estudos mais antigos sobre os antropóides e as sociedades primatas , que tiveram precursores de mérito em Kohler , Zukermann , Yerkes , encontraram em os modernos trabalhos de Terrace , Miss_Patterson , Premack , o casal Cardner , entre outros , a devida continuidade e conduziram a surpreendentes conclusões sobre a psicologia individual e colectiva de os nossos mais próximos parentes em a escala animal . De igual modo , os livros de Desmond_Morris , como o Macaco_Nu e Zoo_Humano , estabelecem uma aproximação um tanto desmoralizadora entre os animais simpáticos que visitamos em as jaulas de os jardins zoológicos e os seres humanos vencedores de a gravidade e protagonistas de a espantosa aventura espacial . Que distância separa afinal o homem médio de o chimpanzé Nim , de o chimpanzé Washoe ou de a sua congénere Sara ? Que fluido subtil distingue o eleitor médio canadiano ou luxemburguês de Koko , a gorila a quem M. Patterson conseguiu , com paciência evangélica , ensinar mais_de 400 sinais e símbolos ? Serge_Moscovici , a o pôr frontalmente a questão de que o homem civilizado , habitante de uma sociedade antinatural , é um animal doméstico que perdeu a o longo de o processo de domesticidade a sua qualidade de ser livre , coloca um problema pleno de sugestões e até de confrontações de natureza ética . Contudo , ainda é em o estudo de as sociedades primitivas e em a interpretação de as suas regras , de a psicologia individual e colectiva , em a sua comparação com as sociedades históricas e actuais , que podemos encontrar mais matéria reflexiva . Os animais inferiores , os primatas e o homem primitivo constituem uma linha evolutiva que se revela sempre mais complexa , até desembocar em o salto qualitativo que é a civilização . E aí parece que um acontecimento inexplicável , uma benção ou maldição , mas certamente uma adulteração de as regras naturais , empurrou o homem para uma via original , com desconhecidos propósitos a que a tecnologia moderna começou a dar contornos aterradores . Será já o homem primitivo um ser antinatural , ou seja , em uma visão puramente naturalista , um doente ? Teria sido com o missing link que se iniciou a marcha irreversível para a patologia social e individual ? O sociólogo Diawara argumenta que a longevidade e estabilidade de as sociedades primitivas justifica a sua sanidade , embora não recuse a sua originalidade frente a a restante vida natural , antes por o contrário . O homem primitivo seria então o primeiro , e afinal o único verdadeiro homem entendido como elemento criador de uma sociedade futura sui generis e verdadeiramente humanas . Entre os seres humanos primitivos , fisicamente deformados e arrastando uma experiência semianimalesca , que mostram as revistas e os jornais , e os seres humanos civilizados entregues a as mãos de uma sociedade de consumo , será difícil optar em termos de qualidade humana ou até de justificação existencial . Por_outro_lado , o estudo histórico de os impérios e civilizações convence -nos de que só em pequenos círculos de cultura o homem revelou aquela alma espiritual que hoje parece ser suficiente para justificar , resumir ou absolver ( como ainda pretendia , com encantadora ingenuidade , o ancião Bertrand_Russell ) a nossa velha e equívoca humanidade . O estudo de as sociedades primitivas ( de as quais não se encontram ausentes nem a violência , nem a crueldade , nem os outros pecados mortais de a espécie , que Koestler assinalou ) traz -nos unicamente a revelação de que em elas não tinham lugar os psiquiatras , mas em todas se encontra o feiticeiro ( o psiquiatra colectivo ou o Moreno de então ) e , pior que isso , o soma pacificante de que Aldous_Huxley falara em o seu Admirável_Mundo_Novo . Este mal de o século , como lhe chamou Hans_Selve , o stress , é doença que já existia em as sociedades primitivas , que existe hoje e que Huxley previa existir em o seu mundo mecanizado e artificial , dominado por uma tecnologia genética que afeiçoava o organismo humano a as tarefas sociais . Mas esse stress que é afinal o resultado de uma incapacidade de adaptação de o homem a o meio-ambiente civilizacional não significará a sua condenação como ser vivo ? O seu carácter epidémico e o facto de ter atingido os centros nervosos e a própria vida psicológica de base , não pode significar que a natureza decidiu que ele começa a não ter condições de continuar a viver , tal como um carro que começa a diminuir a velocidade por falta de combustível ? As tentativas de resposta modernas em a luta contra o stress : a picanálise , o yoga , a meditação transcendental ( ou o recurso a a religião , imprudentemente desacreditada por os livres-pensadores de o século XVIII ) parecem não ser suficientes , nem_mesmo apoiadas por a tecnologia química , com os barbitúricos , relaxantes ou inibidores beta . A vitória sobre o stress , o receio , a angústia e os tanatos a a custa de uma sujeição de o comportamento pessoal e social a o controlo farmacológico levanta contudo problemas morais e põe a questão muito frontal de saber qual a diferença que possa haver entre um ser vivo drogado e um robot activado por anfetaminas electrónicas . Isto leva -nos a compreender muito melhor hoje [aquela afirmação , [410]] aparentemente controversa de o velho Jung , feita durante uma entrevista pouco antes de morrer , ou seja [a [410]] de que o grande homem é aquele que tem mais consciência de a sua condição de macaco...