FAZER A FESTA, LANÇAR OS FOGUETES E APANHAR AS CANAS: Ao que parece, Paulo Pinto Mascarenhas tem a convicção firme de que certa personagem que interpretei está a falar com ele. A generalidade dos malucos ouve a voz de Jesus Cristo ; PPM ouve a minha. Enfim, cada um tem a Alexandra Solnado que merece e, mesmo sendo ateu, parece-me mais do que justo que eu tenha pior sorte que o Messias. Talvez seja bom explicar o que se passa. O povo português tem tido, até agora, a decência de não delegar em PPM qualquer espécie de poder. Mas a verdade é que o povo português não tem sido tão sensato no que respeita a outras pessoas. Eu sei que esta notícia vai cair como uma bomba no 31 da Armada, mas há gente um pouco mais poderosa do que o PPM. É uma coisa muito ligeira, mas tem, de facto, um bocadinho mais de poder. E essa gente, quando se sente atingida, ou quando sente que os amigos foram atingidos (mesmo que seja por uma rábula humorística), pressiona, corta relações com a estação de televisão em que a rábula foi emitida, manda recados com ameaças, faz saber que ficará à espera de uma oportunidade para nos fazer, digamos, coisas bonitas (sempre que posso, uso expressões de Artur Jorge). É isso que tem acontecido desde que o Diz Que É Uma Espécie de Magazine começou e foi o que aconteceu agora, de forma bastante mais intensa, na sequência do sketch sobre Marcelo Rebelo de Sousa. Em tempos, o Herman disse-me que o pequeno poder (e, às vezes, não tão pequeno como isso) sabe encontrar maneiras de pressionar no sentido de fazer censura sem sujar as mãos, de ameaçar sem poder ser denunciado, de intimidar sem aparecer. Na semana passada percebi isso melhor do que gostaria, e dei-lhe razão. Decidimos fazer uma rábula sobre esta espécie dissimulada de censura. Ontem, uma jornalista do DN perguntou-me se tínhamos sido pressionados pela RTP e pelo Provedor do Espectador. Respondi que não, e não menti. Da RTP e do Provedor do Espectador, não veio qualquer espécie de pressão. Quem sobra? No entender do PPM, sobra ele e um post que escreveu no 31 da Armada. Fizemos uma rábula para um milhão e meio de espectadores por causa de um post do PPM no 31 da Armada. Mandei uma mensagem ao Herman a dar-lhe razão por causa de um post do PPM no 31 da Armada. E dei-lhe razão porque, como é óbvio, foi para isso que ele me advertiu. «Põe-te com brincadeiras e vais ver que, um dia destes, o PPM faz um post sobre ti no 31 da Armada », foram as palavras exactas dele. «Tinha razão, Herman », disse-lhe eu agora. Há, no meio disto tudo, um pormenor que pode intrigar o leitor. Se eu já interpretei tantas personagens apalermadas e de discurso incoerente, porque é que o PPM só se sentiu retratado agora? Boa pergunta, leitor. Vagamente insultuosa, mas boa. Eu respondo: por duas razões. Primeiro, porque quando eu disse que a RTP e o Provedor não nos tinham pressionado, a jornalista tirou conclusões que não são as minhas. Segundo, porque a crítica do PPM segue, digamos, a mesma matriz ideológica que o pequeno poder (e, às vezes, não tão pequeno como isso) perfilha. Aliás, a crítica do PPM não é nova, nem é só dele. Já tinha sido usada para pedir a nossa imparcialidade em relação a Salazar e Cunhal. Ou em relação a Pinto da Costa e Luís Filipe Vieira. Ou em relação à Floribella e à Doce Fugitiva. Mas dizem-me que é intelectualmente desonesto falar nisto. Parece que o que é intelectualmente honesto é dizer que um programa humorístico de sátira social e política deve ser imparcial (argumento espantoso). Ou dizer que criticar o prof. Marcelo é fazer campanha pelo Sim. O próprio prof. Marcelo diz que foi criticado por muitos defensores do Não o que só pode significar que, pelos vistos, há gente do Não a fazer campanha pelo Sim. PPM, referindo-se ao sketch sobre o prof. Marcelo, diz que, «em plena campanha eleitoral» quisemos ´ridicularizar os argumentos de um dos lados em confronto no referendo». Primeiro, o prof. Marcelo não representa o Não. Ele mesmo, aliás, afirma que há vários Nãos. Segundo, a nossa rábula sobre o prof. Marcelo foi transmitida no domingo, dia 28 de Janeiro. A campanha começou na terça-feira, dia 30. Dizer que fizemos o sketch «em plena campanha eleitoral» é, portanto, uma... Bom, parece-me que não há maneira delicada de o dizer: é mentira. Não posso deixar de fazer referência às últimas palavras de PPM, que me parecem interessantes: « Ricardo Araújo Pereira pode dizer que não me conhece de lado nenhum, como disse ao 24 Horas. Pode, mas estará a faltar à verdade se o repetir em relação ao Rodrigo Moita de Deus.» Quero agradecer, penhorado, que PPM me autorize a dizer o que eu disse. Já é mais do que costuma fazer, e registo a evolução democrática. Agradeço ainda mais que me ponha de sobreaviso em relação à veracidade do que eu não disse mas, por uma razão que neste momento me escapa, poderei vir a dizer. Uma nota final: estou muito habituado às críticas do PPM, que têm, aliás, sempre o mesmo sentido. Normalmente, comento-as aqui mesmo. Na televisão e na imprensa, costumo satirizar gente que a generalidade do público conhece, e que diz coisas ridículas. Enquanto o PPM continuar a preencher apenas um destes requisitos, pela minha parte também continuarei a responder-lhe apenas aqui no blog. Por isso, e para evitar confusões futuras, gostava de sublinhar o seguinte: se, um dia, eu interpretar uma personagem megalómana, moralista e que mente para fazer valer os seus argumentos, o mais provável é que eu não esteja a satirizar o PPM. Há mais Marias na Terra. RAP